A FÉ ILÍCITA NO FUTEBOL
- Álvaro Ferraz Vilarim
- 8 de out. de 2017
- 4 min de leitura
O universo da febre das apostas em torno dos times de futebol
Carnaval, feijoada, uma boa pinga, futebol. Ícones comuns – íntimos – a muitos brasileiros. Desses, o futebol é tido como a “paixão nacional”. Muito mais do que um esporte, o futebol é intrínseco à cultura, associado a espetáculos, encontros entre amigos, arte, economia, capitalismo, entre outras atividades. O jogo, segundo o historiador Johan Huizinga, “embora seja essencialmente temporal (todo jogo chega ao fim), ele nunca passa despercebido”. E no país, onde por muito tempo reinou/reina o famoso “Jogo do Bicho”, o futebol também não fica de fora da chamada “fezinha”.
Não é difícil encontrar, em qualquer capital ou cidade do interior, banquinhas onde o torcedor faz a sua aposta. Virou febre. E quando não é em barracas pelas calçadas, os fanáticos torcedores-apostadores dão os seus palpites e se reúnem em estabelecimentos maiores (casas de apostas), que dão a eles um certo conforto para acompanhar “de perto”, pela TV, as partidas que podem lhes render não só o êxito da vitória ou a frustração como torcedor, mas a esperança de ganhar um “trocado” com os “pitacos” dos possíveis resultados do futebol.
Cada jogador, ou melhor, apostador, é livre para fazer a sua jogada, arriscar seu lance e tentar finalizar com um grande gol: ganhar a aposta.
Além das bancas e das casas de apostas, os torcedores-apostadores contam ainda com um leque de sites onde tentam a sorte através de um computador ou de um smartphone. No entanto, no "País do Futebol", seja fisicamente ou virtualmente, essa atividade é considerada ilegal mas que, ao hospedar sites foram do Brasil, encontra uma forma de driblar a lesgislação do País.

Em 1941, um Decreto-Lei, no Art. 50, caracteriza o jogo de azar e estabelece penas para quem o explora.


A verdade é que há falhas na fiscalização e, consequentemente, nas punições, principalmente dos sites. A ilegalidade faz seus dribles e as apostas em times de futebol fazem lucro ilícito.
Como funciona uma casa de aposta?
O Desportivo entrevistou um “dirigente” de uma das milhares dessas casas existentes no Brasil. Vamos identificá-lo por um nome fictício: "Cacá". Ele é responsável por um “ponto” subordinado a uma “central”. É uma espécie de franquia.

SITE DESPORTIVO – Há quanto tempo você tem a casa de aposta?
*CACÁ – Desde março desse ano.
S.D. – Por que você decidiu abrir a casa de aposta?
*CACÁ – Já fazia apostas em outras bancas e via que dava lucro. Como estava desempregado, decidi abrir meu próprio ponto de apostas.
S.D. – Como funciona?
*CACÁ – A banca funciona através de uma rede que tem um dono geral e, para ajudar a funcionar todo o sistema, tem algumas pessoas que trabalham para ele. Em cada ponto fica um administrador comandando e fazendo as apostas.
S.D. – Você paga algo para ter/manter ela? Se sim, quanto?
*CACÁ – Não pago nada.
S.D. – Para onde vai o dinheiro dos apostadores?
*CACÁ – O dinheiro é depositado na conta do dono geral.
S.D. – Você fica com alguma parte? Dá lucro?
*CACÁ – Sim, meu lucro é baseado nas apostas feitas. Apostas com apenas um jogo, ganho 5% do valor apostado. Já as com dois jogos, ganho 7% do valor apostado. Com três ou mais jogos, ganho 10% do valor. Como é semanal, o lucro vai depender da quantidade de apostas feitas na semana.
S.D. – Quais são os dias em que os torcedores mais apostam?
*CACÁ – São os dias que têm mais jogos: quarta-feira, sábado e domingo.
S.D. – Como funcionam essas apostas? Qual o mínimo de centavos/reais para poder fazer a aposta? E o máximo?
*CACÁ – Eles [torcedores-apostadores] dão o palpite do resultado do jogo, podendo apostar no vencedor da partida, no empate, na quantidade de gols que a partida vai ter, no placar da partida, entre outras formas de apostas. O mínimo é de 2 reais e não tem um máximo determinado, tem que ser um valor que, ao juntar com as cotas do jogo, não ultrapasse o valor de 30 mil reais, pois é o limite da banca.
S.D. – Qual o valor máximo que já apostaram? Qual o máximo que a banca já pagou? O apostador pega o prêmio onde?
*CACÁ – O máximo que apostaram foi 1.000 reais. A banca já pagou até 2.800 reais em uma aposta. Quando o valor é baixo, o apostador pega o prêmio na própria banca, já quando é mais alto o prêmio é depositado na conta.
S.D. – Já teve algum problema?
*CACÁ – Às vezes falta dinheiro para pagar alguma aposta, mas logo depositam na conta e eu pago ao ganhador. Outro problema também quando o sistema fica fora do ar e, com isso, só consigo fazer aposta quando resolvem o problema.
S.D. – No mais, vale a pena ter a casa de aposta?
*CACÁ – Vale, pois é uma forma de renda.

Enquanto as apostas tornam-se renda para os dirigentes, e até mesmo para os torcedores-apostadores, o Brasil fica no impedimento e deixa de faturar bilhões de reais.
Estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) revela que as apostas movimentariam algo próximo de R$ 10 bilhões ao ano, caso fossem legalizadas. Desse valor, cerca de R$ 2,7 bilhões seriam recolhidos como impostos – um valor bastante significativo para um país marcado por corrupção em desvios de dinheiro. Sem falar que as apostas, tornando-se legais, poderiam movimentar a economia e criar empregos. E, a exemplo da Europa, poderiam abrir grande concorrência entre marcas que investiriam em clubes através de patrocínios.

O estudo desenvolvido pela FGV foi encomendado pela Caixa Econômica Federal e revela: o Brasil marca gol-contra em não revisar a sua legislação e tornar lícito os jogos de azar.
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