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“ESPORTIVIZAR A CAPOEIRA É LIMITAR A CULTURA BRASILEIRA”

  • Maria Eduarda Bravo
  • 20 de out. de 2017
  • 5 min de leitura

Essa frase de Ruy Bandeira, ou melhor, Mestre Papagaio, precisa ser reconhecida. Esta reportagem foi pensada para tratar da capoeira como um possível esporte olímpico. Bem, não deu. A capoeira em si não precisa. Lógico que ganharia um maior espaço nos meios de comunicação, mas a prática já é brilhante, valiosa e intensa.

A capoeira mostra que o Brasil é rico em cultura. Isso porque, nas aulas, se aprende que em cada lugar há um costume, um hábito, uma comida diferente. É a diversidade brasileira que torna cada povo, etnia ou raça algo especial, exclusivo. “Capoeira tem seus rituais, cada escola terá o seu e o esporte olímpico é algo unificado”, completa o Mestre do grupo Raízes do Brasil.

 

SUAS RAÍZES

É interessante como muitos costumes antigos foram adaptados para o nosso dia a dia. O modo de sentar com as pernas

dobradas foi “emprestado” dos índios. A pizza, dos italianos, e por aí vai. A capoeira vai além. Ela é a fusão de diversas manifestações culturais que vieram da África no período de escravidão.

A capoeira é uma manifestação brasileira, uma arte marcial desenvolvida pelos escravos africanos do Século 19. A verdadeira

história não é clara, mas sabe-se que surgiu no meio urbano. A maioria das pessoas envolvidas na capoeira – historiadores, Mestres e praticantes - acreditam no seguinte:

Na década de 1500, muitos africanos foram retirados de diferentes áreas da África Ocidental e levados ao Brasil para serem usados ​​como escravos pelos portugueses. Eles foram tirados de suas terras, mas sua cultura e desejo de liberdade não poderiam ser subtraídos. Com essa necessidade de crescimento da liberdade, começaram a desenvolver técnicas para se defender e fugir.

É claro que os escravos não podiam praticar artes marciais, o segredo era disfarçar. Na África, a dança e a música são as formas mais populares de expressão. Então, os escravos desenvolveram uma maneira de praticar diferentes técnicas defensivas e ofensivas com música, canto e dança, como disfarce natural.

A capoeira foi vista em três regiões brasileiras que se comunicavam entre os portos do Rio de Janeiro, Recife e Salvador.

“A visualização que teve através dos portos, fez gerar esse fenômeno por volta de 1615”, afirma o Mestre. Foi nesse ano que encontraram o primeiro documento, um registro policial, onde citava a capoeira.

O capoeirista já não era reverenciado como lutador e herói da liberdade, mas sim temido como bandido e criminoso.

Jornal “Diário de Notícias”, Rio, 25–11–1870

A desmarginalização da capoeira ocorreu através da criação de centros e da iniciativa de grandes Mestres, como Bimba

e Pastinha, e hoje já se espalhou pelo mundo inteiro.

Mestre Bimba

Após a abolição da escravatura, de 1890 a 1937, a capoeira foi proibida por lei:

Em 1935, a capoeira deixou de constar como arte proibida com a queda do Decreto de 11 de outubro de 1890. Posteriormente,

em 1937, a então Secretaria da Educação conseguia um registro oficial que qualificava seu curso de capoeira como Curso de

Educação Física. Em 26 de dezembro de 1972, a capoeira foi homologada pelo Ministério da Educação e Cultura como

modalidade desportiva.

 

O RITUAL E SEUS TIPOS

Embora pareça ser uma dança inofensiva, os dançarinos ou "Capoeiristas" praticavam técnicas de luta mortal. Como já mencionado,

era necessário ser disfarçado, e os truques são parte do que separa a Capoeira de outras artes marciais. Muitos dos chutes e movimentos realizados podem ser vistos em outras artes, mas a diferença é a entrega. Há muitas falsificações e movimentos enganadores na Capoeira.

Geralmente, a luta é disputada dentro de um círculo de pessoas chamado de "roda". As pessoas no círculo são geralmente outros capoeiristas à espera de "brincar" e de serem observadores. Jogador ou não, você deverá dar energia à roda batendo palmas e cantando em resposta à pessoa "responsável", que na maioria das vezes é o Mestre.

Existem vários instrumentos utilizados para fazer a música na roda:

Numa roda de capoeira, quem manda no jogo é o berimbau, pelo som e pela música, um dos tipos, a ‘Capoeira de Angola’ é um jogo mais lento, mais malandriado, mais solto. Onde o capoeirista joga com um sorriso no rosto mesmo querendo derrubar o “adversário”.

Os movimentos são sempre próximos do chão, bem curtinhos e entrelaçados. Existe a ‘Benguela’, que é um jogo mais floreado, mais cadenciado, e faz parte da ‘Capoeira Regional’, com o toque mais lento, recomendado para quem está começando, sem muito chute, sem muito contato. A ‘Capoeira Regional’, é aquela que envolve um treinamento. É um jogo mais rápido, com chutes fortes, muito expressivo e sempre acompanhado pelo berimbau. O ‘Esquenta Banha’ são os 10 minutos finais da roda. O jogo se torna bem mais rápido, sem floreios, só com chutes e entradas. Existem mais variações que surgiram ao longo do tempo, mas são mais específicas e mais incomuns.

 

BATIZADO

Uma vez por ano, o grupo possui uma celebração importante: o batizado. Os alunos que estão começando são apresentados aos mais velhos. Eles são iniciados e recebem seu apelido e corda (classificação).

Durante o batizado, o novo conhecimento da tradição se renova. Você pode ver a felicidade e a ansiedade nos rostos dos alunos. Nos dos Mestres, se vê a satisfação de poder entender, aprender e ensinar esta arte.

Elevação de grau Mestre Papagaio

 

SIM, A ARTE TAMBÉM TEM SEUS BENEFÍCIOS FÍSICOS E SOCIAIS

O objetivo do jogo da capoeira não é a derrota do adversário, mas a exibição das habilidades dos jogadores em um diálogo físico, na medida em que exige capacidades que vão além da força. Capoeira é mais do que exercitar para alcançar o fitness, é uma forma de arte, que, através de movimentos, exibe e compartilha habilidades como meios de expressão pessoal.

A capoeira é utilizada no Raízes do Brasil como um projeto social e ferramenta educacional, onde as pessoas de todas as idades têm a oportunidade de praticá-la. "Capoeira é uma arma contra as drogas e a violência. Damos a oportunidade para que eles possam conhecê-la", disse o professor Rafael.

“Ela lhe dá tanta agilidade, muita movimentação. E foi justamente isso que ela trouxe para mim, a fortificação do meu próprio corpo”, é o que afirma o aluno do grupo Raízes do Brasil, Lorival Santos, que na capoeira é conhecido como Angu.

 

FUNDADORES DA CAPOEIRA? A CULTURA AGRADECE

Existem poucos documentos históricos remanescentes sobre os movimentos negros durante a escravidão brasileira. Em 1890, o governo brasileiro queimou todos os documentos relacionados à escravidão. Portanto, não está totalmente claro até que ponto a Capoeira foi usada como arma para apoiar a abolição da escravidão no país. No entanto, é claro que, durante a escravidão, a Capoeira foi referida como um jogo inofensivo por seus praticantes para não criar suspeitas sobre o fato de que eles realmente praticavam uma arte marcial. O fato de os escravos considerarem que a “camuflagem” era necessária sugere que praticar a atividade durante este momento brasileiro estava relacionado a propósitos de resistência social e não apenas a atividades tradicionais.

A história provou que a escravidão brasileira estava diminuindo gradualmente por razões diferentes. As epidemias locais e a diminuição dos negócios transatlânticos, entre outros, desempenharam um papel até sua completa abolição em 1888. A capoeira passou por um processo sócio-histórico que o transformou de uma atividade usada como uma dança recreativa para uma ferramenta de autodefesa e de resistência contra a opressão. Diminuir o valor da atividade como uma arte marcial para a autodefesa, durante a escravidão brasileira, corre o risco de descartar sua importância neste relevante evento histórico.

Atualmente, fazer parte de um grupo é considerado algo sério, independentemente do país de origem. A maioria dos grupos latino-americanos tendem a fazer constantes recordações e representações sobre a importância e o uso dessa arte marcial durante as lutas da abolição do negro no Brasil. Neste sentido, a Capoeira é mais do que uma arte marcial, música e acrobacias.

Representa liberdade e promove o respeito e a tolerância aos parceiros, professores e adversários. Estes valores humanos provêm da resistência social dos negros, da confiança social e da solidariedade. Manter a Capoeira viva nos lembra que sempre é possível encontrar meios alternativos para alcançar a liberdade e lutar contra a opressão, desde que os oprimidos permaneçam juntos. Fica a dica:

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